O Supremo Tribunal Federal começou a discutir, nesta quarta-feira (7), se o Poder Público pode ser responsabilizado civilmente por eventuais danos causados por atos protegidos por imunidade parlamentar. Na sessão desta tarde, foram feitas a leitura do relatório e as sustentações orais das partes envolvidas. O início da votação será agendado em outra data.
Sustentações orais
Vicente Martins Prata Braga, procurador do Ceará, afirmou que está sendo imputada ao Estado uma responsabilidade pecuniária em razão de agente político que detém a imunidade. Sustentou que o Estado não pode ser fonte de custeio de indenização por fala proferida pelos seus agentes, sob pena de danos aos cofres públicos e defendeu o deferimento do recurso.
“Não estamos buscando imunidade absoluta, no qual o parlamentar eleito possa falar o que bem entender. Nós estamos buscando que, se entender que houve excesso, o ato judicial retire o manto da imunidade”, argumentou.
Representando o Senado Federal, a advogada Gabrielle Tatith, afirmou que a inviolabilidade do mandato parlamentar é uma garantia constitucional. Ela ressaltou que a imunidade parlamentar não é um privilégio, mas sim uma prerrogativa institucional e defendeu a tese da responsabilidade civil seja rejeitada pelo Supremo.
“Não há representação política sem a garantia da liberdade de expressão qualificada do parlamentar. Também não há democracia nem separação de poderes, se as imunidades são enfraquecidas ou anuladas”, argumentou.
Caso discutido
O caso em análise é o Recurso Extraordinário (RE 632115) em que o Estado do Ceará questiona decisão do Tribunal de Justiça estadual que reconheceu sua responsabilidade por dano moral causado por um deputado estadual durante pronunciamento na Assembleia Legislativa.
Sob relatoria do ministro Luís Roberto Barroso, o tema teve repercussão geral reconhecida pelo STF em 2017. A questão central é definir se a inviolabilidade civil e penal assegurada aos parlamentares afasta a responsabilidade civil objetiva do Estado, prevista no artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal.
Ao defender a repercussão geral do tema, Barroso explicou o dilema enfrentado: “De um lado, a imputação de responsabilidade civil objetiva ao Estado por opiniões, palavras e votos de parlamentares parece reforçar a ideia de igualdade na repartição de encargos sociais. Por outro lado, o reconhecimento desse dever estatal de indenizar por conduta protegida pela imunidade material pode constranger a atuação política e o próprio princípio democrático”, ressaltou o ministro.
Em sua defesa, o Estado do Ceará sustenta que não pode ser condenado ao pagamento de indenização por danos morais porque o ato questionado é amparado pela imunidade parlamentar em decorrência de opiniões, palavras e votos, conforme prevê o artigo 53 da Constituição Federal.
Limites da imunidade parlamentar
Durante a manifestação da advogada-geral do Senado, em sessão nesta tarde, o ministro Edson Fachin, perguntou se a tese defendida por ela era de que não há limites na imunidade parlamentar.
A advogada respondeu que se trata de um debate complexo e que o controle de excessos ou moderação do discurso deve ser exercido no âmbito político pelas duas Casas Legislativas: Câmara e Senado.
No entanto, a representante do Senado ressaltou que, nos casos de discursos de ódio, o entendimento é de que o Poder Judiciário pode exercer controle “excepcional”.
Excesso de judicialização
O presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, relator do recurso, afirmou que, na sua avaliação, a responsabilidade do Estado, em regra geral, é subjetiva, somente sendo objetiva por exceção.
Ele alertou para o excesso de responsabilização civil do Estado no país. Segundo o ministro, só em 2024, foram pagos 70 bilhões em precatórios. “Uma conta que vem subindo”, disse.
Barroso informou que o STF está contratando uma consultoria para entender essa grande litigiosidade contra o Poder Público, que segundo o ministro, é “a maior do mundo”, ressaltou.
De acordo com o ministro, as cinco maiores causas de processos são: serviço público, previdência, tributária, saúde e trabalhista.
Cavalo de Tróia
A ministra Cármen Lúcia lembrou que a imunidade foi criada para defender o estado de direito, mas defendeu que é preciso impor limites para não deixar “um cavalo de tróia” destruir o próprio Estado de Direito.
“Ele pode subir e resolver fechar o próprio Congresso, fechar o Supremo(…) isso não é imunidade, isso é impunidade”. Cármen Lúcia continuou:“a Impunidade descombina com o Estado Democrático de Direito”, concluiu a ministra.